quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

De volta para o passado

Um argumento comum usado contra a aplicação do árbitro de vídeo é de que se acabaria com a “discussão de bar”, sabidamente um dos pilares da cultura futebolística brasileira – nada é tão prazeroso quanto aquele colóquio informal desenvolvido entre uma cerveja e uma coxinha, bem sabemos. Devem pensar os críticos da tecnologia que, após sua implantação, os torcedores deixariam de frequentar o bar para se reunir em uma ilha de edição de imagens.

É um equívoco abissal. Afinal de contas, o torcedor quase sempre é um lunático (e assim deve ser), mas nunca é burro. Quer dizer, pode ser em outras áreas da sua vida, pode estar investindo em ações da Petrobrás neste exato momento, mas nunca quando se trata do seu time. E nenhuma dor é mais pungente do que aquela garfada na costela desferida por um juiz inepto ou mesmo mal-intencionado. As pautas do bar nunca vão faltar: o que nosso heroico torcedor anônimo definitivamente não deseja é comer sua coxinha entre soluços e lágrimas, ruminando os traumas recentes que vão reverberar para o resto da vida.

No Conselho Técnico realizado na tarde de segunda-feira, na sede da CBF, ficou definido que o Campeonato Brasileiro 2018 não vai contar com o árbitro de vídeo. Por outro lado, está liberada a farra da venda do mandos de campo: serão permitidos cinco jogos fora do estado de origem, de 19 possíveis – ou seja, mais de 25% do total de partidas. Só não se pode negociar mando de campo nas últimas cinco rodadas, medida que em um sistema de pontos corridos não faz qualquer sentido. Resumindo: pensando de forma individualista e sob influência da CBF, como costuma acontecer, os clubes decidiram pela continuação de um campeonato que provavelmente vai pender para o desequilíbrio técnico e para suspeitas em relação à arbitragem.

O árbitro de vídeo não foi implantado, é o que se diz, por um motivo prioritariamente econômico. A CBF não quis bancar os R$ 20 milhões que seriam necessários, segundo contas dela mesma, e esse valor precisaria ser bancado pelos clubes. Alguns aceitaram, mas a maioria se opôs. Chama a atenção que, segundo o jornalista Mamede Filho, o recurso já é aplicado no Campeonato Português por cinco vezes menos do que isso – cerca de R$ 4 milhões.

O ponto crucial neste perrengue é que a confederação deveria arcar com os custos para implantar o árbitro de vídeo, afinal é ela quem organiza o campeonato. Mas, se isso não é possível, possivelmente por descaso da própria CBF, os clubes deveriam ao menos questionar e encontrar uma solução. Em último caso, talvez matar no peito e ao menos nesta temporada colocar em prática o recurso que, no fim das contas, lhes seria benéfico. A prova de que a negativa de vários deles não está ligada apenas ao aspecto financeiro é que Chapecoense e Bahia, por exemplo, que recebem cotas muito inferiores em comparação aos maiores soldos, defenderam com veemência o uso do árbitro de vídeo.

Digamos que os clubes sequer se dispusessem a proceder com aquela singela manobra tão cara à economia doméstica e sair fazendo uns orçamentos por aí para diminuir este montante, e o valor de fato ficasse em R$ 1 milhão por instituição. É uma grana violenta, obviamente, mas acabaria diluída em parcelas não tão dolorosas pela evidência de que um simples erro de arbitragem pode custar um título, uma vaga na Libertadores e a própria permanência na primeira divisão. Os clubes decidiram que seu futuro, por enquanto, continua dependendo de um par de olhos demasiado humanos.

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