Enquanto no Chile, onde a população total é quase 18
milhões de pessoas, ocorreram quatro assassinatos de transexuais,
travestis, lésbicas, bissexuais ou gays (LGBT) no ano passado, no
Brasil, com mais de 200 milhões de habitantes, o número foi 313
homicídios, segundo levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia (GGB).
“Comparei esses índices e vi que a chance de um LGBT ser assassinado
aqui é 80 vezes maior”, explicou o antropólogo Luiz Mott, um dos
pioneiros do movimento no país.
Mott é o responsável pela pesquisa feita há mais de
dez anos e baseada em notícias divulgadas pela imprensa e denúncias
coletadas principalmente em cidades do interior do país, onde as
estruturas de garantia de direitos humanos é mais precária. Segundo ele,
44% dos casos de homofobia letal identificados em todo o mundo ocorrem
em território brasileiro.
Só no último mês foram registradas 16 ocorrências.
De janeiro até hoje, foram 218 mortes de LGBT no país, dos quais 71 por
tiros, 70 a facadas, 21 espancados, 20 por asfixia, 11 a pauladas e seis
apedrejados, entre outros.
Apesar dos números apontarem que a maior parte dos
casos envolvem gays (124), Mott explicou que os transexuais são,
proporcionalmente, os mais afetados pelos crimes. “Enquanto os gays
representam 10% da população, cerca de 20 milhões, as travestis não
chegam a 1 milhão e têm número de assassinatos quase igual ao de gays”.
Este ano, 84 travestis foram assassinadas, número bem superior ao de
lésbicas (cinco) e bissexuais (dois).
“Nunca se matou tantos gays e, sobretudo, lésbicas,
que teve um número muito maior de assassinatos do que em anos
anteriores”, lamentou Mott. Ele acredita que a única forma de redução de
ocorrências fatais seria a criminalização da homofobia. Luiz Mott
ressaltou que há um Brasil cor-de-rosa das paradas gays e um Brasil
vermelho “que pode ser representado pelos crimes e por amostras dadas
por pessoas públicas como [o candidato à Presidência da República] Levy
Fidelix (PRTB). Se ele tivesse falado metade do que disse sobre negros
já estaria preso”, destacou.
Fidelix declarou em um debate na TV Record, no
domingo (28), que homossexuais precisam de atendimento psicológico e
comparou a homossexualidade à pedofilia. Desde que a declaração foi
feita, quase 3 mil denúncias de violação dos direitos da populac a o de
transexuais, travestis, lésbicas, bissexuais e gays foram registradas
pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR)
por meio de números como o Disque 100 e o Ligue 180, segundo assessoria
de imprensa do órgão. A reportagem da Agência Brasil tentou contato com
os responsáveis pela estatística, mas até o fechamento da matéria não
foram indicados nomes que pudessem comentar os números e por que foi
feita a relação entre a declaração do candidato e o volume de denúncias.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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No Congresso Nacional, tramita, desde 2006 um
projeto que altera a Lei 7.716, de janeiro de 1989, que trata dos crimes
de preconceito de raça ou de cor, criminalizando a homofobia e
incluindo a prática na lei. O texto está na Comissão de Constituição e
Justiça do Senado desde o final do ano passado aguardando votação.
No cenário internacional, o Brasil liderou, ao lado
de Uruguai, Chile e Colômbia, uma resolução que foi aprovada na semana
passada pela Organização das Nações Unidas (ONU), estabelecendo que a
entidade apresente um estudo sobre as violações contra homossexuais
ocorridas no mundo. Essa resolução é um segmento de uma outra
apresentada em 2011 sobre o mesmo tema”, explicou Camila Asano,
coordenadora de Política Externa da organização não governamental
Conectas Direitos Humanos, que desde janeiro de 2006, tem papel
consultivo na organização.
Segundo ela, depois da apresentação do primeiro
estudo sobre casos de violência, elaborado pela ONU, o tema perdeu
espaço nas discussões da organização. Para Camila Asano, a nova
resolução é uma maneira de assegurar as conquistas de três anos atrás.
“Os grandes feitos dessa resolução, que o Brasil foi líder junto com a
África do Sul, foram reconhecer como direito humano a orientação sexual e
a identidade de gênero e de condenar a violência e a discriminação”,
explicou.
A coordenadora da Conectas, que acompanhou as
negociações na reunião deste ano, em Genebra, lembrou que a diplomacia
brasileira precisou redobrar esforços para aprovar o texto que foi
aprovado num placar de 25 votos favoráveis, 14 contrários e sete
abstenções. “A resolução acabou gerando uma ira muito forte de países
conservadores, como alguns africanos que criminalizam os homossexuais,
como os islâmicos. O Brasil teve que usar de toda sua capacidade e
vantagem diplomática para fazer a negociação e fazer com que o texto
fosse aprovado. É uma vitória histórica”, disse.
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