Mesmo após diversos escândalos, somente no começo deste
mês, no Comitê da ONU para os Direitos das Crianças, representantes do
Vaticano se pronunciaram sobre casos de pedofilia na Igreja Católica. De
acordo com o porta-voz da Santa Sé Federico Lombardi, 400 religiosos
foram expulsos do sacerdócio entre 2012 e 2013, mas ainda existem cerca
de 4 mil casos em investigação. E fora da Igreja, o quadro geral é
também preocupante: em 2013, mais de 3,1 mil casos foram denunciados.
No Brasil, há apenas uma delegacia dedicada ao crime. O
número de abusos sexuais infantis no País, no entanto, vai além do
registrado por conta da omissão da denúncia, segundo especialistas
entrevistados pelo Terra, e o crime pode criar um
círculo vicioso, já que entre as consequências da pedofilia na vida
adulta estão transtornos sexuais, depressão e até a repetição do assédio
em outras crianças.
Só no Rio de Janeiro, três crianças a cada 10 minutos são vítimas de pedofilia
Maura de Oliveira
vítima, pesquisadora e ativista
Maura de Oliveira foi vítima de pedofilia e passou 10
anos sofrendo violência sexual, dos seis aos 16 anos, na casa da família
adotiva onde vivia. De acordo com ela, só no Rio de Janeiro, três
crianças a cada 10 minutos são vítimas de abuso sexual. “Eu fui criança
de rua até os seis anos no Rio de Janeiro. Nunca sofri violência nas
ruas, mesmo tendo que comer lixo para sobreviver, mas nessa casa passei a
ser abusada pelo patriarca da família, um comerciante que tinha cerca
de 60 anos”, relatou. Segundo ela, em 90% dos casos, o pedófilo é
conhecido da criança e dos parentes, o que torna ainda mais difícil a
denúncia. Com a criminalização da pedofilia – a pena vai de oito a 15
anos de prisão – “os próprios familiares impedem a vítima de denunciar”,
disse a ginecologista e coordenadora do Grupo de Apoio à Vítima de
Violência Sexual (GAVVIS) Valéria Batista.
Mari Araújo se lembra até hoje de como foi ignorada
quando pediu ajuda. A primeira vez que foi abusada, por uma tia, estava
com três anos: “não tinha a mínima noção do que estava acontecendo”.
Depois que o pai morreu, Mari tinha nove anos, passou a ser abusada pelo
padrasto e devido às ameaças verbais e com arma de fogo, ela entendeu
que aquilo tudo era errado. “Após minha mãe se divorciar, tivemos que
aceitar um pensionista: ele se tornou meu abusador até os quatorze
anos”, relatou. “Me sentia humilhada. Não tinha coragem de me expor,
tinha muito medo e vergonha”, acrescentou.
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