“Eu já esperava perder, mas não de 5 a 0”, confessou o
presidente da Portuguesa, Manuel da Lupa, após ver sua equipe rebaixada à
Série B no "tapetão”. Antes da sessão do Superior Tribunal de Justiça
Desportiva (STJD), o advogado da Lusa, em entrevista ao Terra, não demonstrava, igualmente, muito otimismo: “seja o que Deus quiser”.
Na tarde desta segunda-feira, não foi o que Deus quis,
mas o que os auditores do STJD entenderam ser uma questão de moralidade:
a aplicação do artigo 241 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva
(CBJD). Com cenas de digno pastelão, com citações ao Papa Francisc, e
torcedores do Fluminense abraçando um advogado de terno, que sequer
representava a agremiação para a qual se dizem devotos, o futebol
brasileiro registrou mais um triste capítulo.
Não só pela falta de organização do mesmo tribunal, que
não soube equalizar a alta demanda de profissionais de imprensa em seu
apertado plenário, mas pela clara indicativa de que, por mais que não
tenha havido dolo, e uma falha de comunicação tenha sido o fiel da
balança - junto à negligência dos dirigentes da Portuguesa, é bem
verdade -, nada disso foi levado em conta pelos auditores. As cartas já
estavam marcadas. Valeu o que estava escrito no regulamento. E ponto.
A primeira testemunha de defesa a ser ouvida foi o
diretor do departamento jurídico da equipe paulista Valdir Rocha. O
mesmo que o advogado Oswaldo Sestário garantiu ter comunicado a
aplicação dos dois jogos de suspensão ao meia Heverton, que entrou em
campo no empate sem gols diante do Grêmio, na reta final do segundo
tempo, indevidamente.
Após seguidas falhas do microfone, ele citou dois pontos
em que a tal negligência por parte da Portuguesa poderia ser atenuada:
um site em que a CBF disponibilizava as suspensões desde o dia 1º de
setembro deste ano e os seguidos contatos com o advogado que há nove
anos representa a agremiação. “Quando o Sestário não nos comunicava, era
nossa dinâmica saber que não tinha nada, que era coisa de uma partida
ou absolvido”, frisou.
Posteriormente, foi a vez do presidente da Portuguesa, Manuel da Lupa,
ter o microfone em mãos para relatar que, em conversa com o mesmo
advogado, obteve dele a declaração de que “a responsabilidade era dele”.
“Mas como, se a Portuguesa é quem vai ter problemas na Justiça?”,
retrucou. De nada adiantaram suas palavras, de nada adiantou ter trazido
três atletas do clube ao plenário: : o lateral Juan, o goleiro Tom e o
atacante Romão.
João Zanforlin, figura notória no STJD e há anos como
advogado também do Corinthians, bateu na tecla de que “o direito não é
uma ciência exata. É uma ciência humana”. “Esse menino (Héverton) foi
igual ao chuchu: não fez mal, não fez bem. E agora vão dar um tiro na
Portuguesa?", indagou. Sobrou até para o novo líder da Igreja Católica:
“vamos ter que recorrer a quem (para explicar a situação do clube), ao
Papa Francisco?”. Declaração forte, mas em vão.
Mário Bittencout, advogado do Fluminense, se apegou ao
debate da “moralidade contra a legalidade” e pediu aos auditores que
"não se convençam pelo emocional, nem pela opinião pública. Se faz
Justiça aplicando direito. Pura e simples”. “O Fluminense não fez nada
para isso que está acontecendo. Está, sim, cumprindo o regulamento dessa
casa”, completou.
Foi o entendimento geral de todos os auditores, que
seguiram à risca o voto do relator Felipe Bevilacqua. “Se mudássemos
nossa jurisprudência, já ouvi falar que o Corinthians pode cair. E que o
Botafogo pode perder a Libertadores. Se isso acontece nesse processo,
com relação ao prazo, imaginem os senhores, todos reunidos aqui para
saber se o Corinthians cai?", citou.
Após citar os casos de Guiné Equatorial, Cabo Verde e
Etiópia, que em casos semelhantes tiveram o mesmo tipo de punição, por
parte da Fifa, nas eliminatórias africanas para a Copa do Mundo de 2014,
Bevilacqua confirmou o que considerou “um erro primário” e condenou a
Portuguesa com a perda de quatro pontos, mais multa de R$ 1 mil.
Conforme os votos iam sendo computados, era possível
ouvir, mesmo do 15º andar do prédio do STJD, os torcedores do Fluminense
comemorando cada decisão como um gol. Eram gritos incessantes de
torcedores apaixonados e cegos, na mesma proporção, que comemoravam o
triste tricampeonato conquistado junto ao STJD. Não vão, por ora, ter
que pagar a Série B. Pelo menos até a data do julgamento do recurso, no
próximo dia 27.
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